Para Além dos Seios: mais do que um filme, uma ferramenta política, social e cultural

Em cartaz na Sala de Arte da UFBA, “Para Além dos Seios” traz questões ligadas à contemporaneidade como feminismo, mastectomia e aborto

Por Luiza Leão

Mastectomia, transexualidade, assédio, violência contra a mulher, aborto, feminismo. Essas são algumas das questões contemporâneas abordadas no filme Para Além dos Seios, com argumento e direção de Adriano Soares, mais conhecido como “Big”. O longa, em cartaz há 11 semanas, está sendo exibido diariamente às 15h45, na Sala de Arte da UFBA até o dia 25/05.

Na perspectiva do documentário, são diversas as possibilidades de representações existentes para além dos seios.  O seio que carrega a maternidade, o sexismo, o erotismo, a repressão. Suas significações fazem parte de uma construção social que estão muito além de representar o gênero feminino. Nessa pluralidade de significados, o cineasta Big modificou diversas vezes o argumento do documentário. “Foi um eterno processo de criação”, explicou.

Eram muitas histórias escutadas, desde o período de construção até a fase de conclusão. A escolha de Salvador como cenário para o filme vem desde o ambiente de proximidade do diretor com as histórias dos personagens e da própria cidade, passando pelo incômodo do produtor com as representações da diversidade no campo do audiovisual. Essas representações, segundo Big, são rasas, estereotipadas, provenientes de um discurso pejorativo, cisgênero e hegemônico, pautado em “valores religiosos hipócritas”.

“Para Além dos Seios é mais do que um filme para mim. Vejo como uma ferramenta política social e cultural”, define o bacharel em artes com concentração em cinema e audiovisual, Adriano Big. Para valorizar a mulher e incentivar a visitação do público, a senha “lugar de mulher é na presidência”, ao ser ser dita na bilheteria, garante ao expectador o pagamento da meia entrada.

Voz

Em uma das cenas do documentário, a boca das mulheres vira uma vagina para representar a voz de seus corpos. O lugar de fala é das mulheres. “Entrei em contato com sofrimentos humanos que eu nem sabia que existiam”, explicou o diretor, assumindo não ser dono desse lugar de fala. Para entender a visão de cada uma das mulheres sobre as questões que queria tratar no filme, suas dúvidas surgiam como provocações. Assim, as personagens reais narravam suas histórias. Seu papel era o de direcionar a temática, enquadrar a câmera e ouvir sem fazer juízo de valor.

Defensor de narrativas que respeitem o lugar de fala dos atores envolvidos na questão, Big também produziu A Melhor Idade, outro filme do cineasta, que parte de relatos, desta vez, de um idoso. Por isso, é contrário a roteiros que tentem empoderar determinado universo sem dar voz a quem entende e está implicado no tema.

Para que o público masculino se identificasse com o documentário, Ednilson Sacramento foi escolhido para integrar o corpo cênico.  Deficiente visual desde os 30 e poucos anos, hoje, aos 50, está distante do bombardeamento imagético da sexualização feminina. A escolha foi feita como uma metáfora aos machistas, que deveriam se colocar como um homem cego, para ouvir o que as mulheres têm a dizer, percebendo que aquele não era o seu local de fala.

Produção e circulação

A alternativa mais racional para que o dinheiro não se perca, principalmente quando há poucos recursos financeiros, é a organização. Big conta que, para a produção do longa, a equipe foi reduzida e organizada. Com o edital do Bahiagás no valor de 30 mil reais, a quantia só custeou a finalização das equipes de  áudio e imagem.

Para além dos seios está há 11 semanas em cartaz no circuito alternativo, primeiro no Cinema do Museu e, agora, no Cinema da UFBA. Esta permanência relativamente longa pode contribuir para que o filme possa chegar a outros estados do país, além de servir como uma arma para se mostrar o interesse do público por questões relacionadas ao gênero e à diversidade, acredita Big. Mas, para isso, o documentário enfrenta a difícil concorrência com o cinema comercial nacional e internacional.  

A emoção de quem assiste o longa e as reflexões que são despertadas, não são sensações pertencentes apenas aos expectadores. Enquanto produtor, Big revelou ter sido tomado pela emoção diversas vezes durante o processo.

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