Artigo: Visibilidade jurídica PCD
Murilo Rigaud
A luta do movimento PCD não é recente e ainda está longe de acabar. As necessidades que as pessoas com deficiência possuem estão nos mais diversos âmbitos da vida em sociedade. Como tentativa de garantir uma maior igualdade para essa parcela da população, foi criado o estatuto PCD, inicialmente chamado de “Estatuto do portador de necessidades especiais” e atualmente conhecido como LBI (Lei Brasileira de Inclusão), no dia 9 de outubro de 2000. O estatuto é um conjunto de leis que visa regularizar as relações jurídicas que possam incidir sobre as pessoas ou coisas.
A constituição de 1988 garante alguns direitos às pessoas com deficiência, porém, de uma forma bem generalizada. Leis mais especificas foram sendo elaboradas para promover e assegurar a condição de igualdade, inclusão social, liberdades individuais e cidadania. A primeira versão do estatuto PCD foi apresentada nos anos 2000, mas a sua aprovação aconteceu, de fato, 15 anos depois. Dentre as obrigações que se encontram nesse conjunto de leis estão: a garantia dos direitos fundamentais (educação, saúde, moradia, trabalho e transporte, por exemplo), acesso à informação e comunicação (acessibilização dos sites públicos e privados) e a penalização destinada àqueles que não cumprem essas leis.
Olhando por um ponto de vista jurídico, a situação dos deficientes no Brasil seria igual ao dos não-deficientes no aspecto do amparo físico, logo que as carências da população PCD estão listadas e são obrigadas pelo Estado aos demais e a si próprio a serem endireitadas, inferindo punições aos infratores caso não o façam. Infelizmente, a realidade é bem diferente do que está escrito no papel. No Brasil, os deficientes vivem uma realidade na qual eles possuem visibilidade jurídica, contudo, ninguém os vê nas ruas, nas escolas ou universidades, nas empresas…
Visibilidade jurídica, como o próprio nome diz, é ser percebido e defendido pela jurisdição, entretanto, essa percepção não é garantia que as leis estabelecidas serão. Situações como ocupar as vagas de estacionamento destinadas aos PCDs nos bancos e supermercados ou não haver interpretes de Libras nos prédios públicos são bem comuns de serem vistas. Mesmo com a aplicação das multas as empresas, os órgãos públicos e os cidadãos, de uma forma geral, não respeitam a LBI.
A demora na promulgação do estatuto é um dos principais motivos para não encontrarmos todos os locais, tanto virtuais quanto reais, adaptados adequadamente às dificuldades que os cadeirantes, os cegos, os surdos e os outros tipos de deficientes passam no dia a dia. Outro ponto que dificulta o cumprimento das leis é a ideia de que não enxergamos os deficientes nos espaços nem como possíveis ocupantes dos mesmos. A sensação das pessoas ao verem um piso tátil que se encontra no chão do shopping ou da cadeira reservada na sala do cinema é de mero enfeite, apenas para mostrar aos não-deficientes que o espaço que eles frequentam “se preocupa com acessibilidade” e é justamente nesses momentos que o capacitismo se manifesta.
Os dois pontos citados acima corroboram para a exclusão da pessoa com deficiência e a perpetuação do capacitismo na sociedade brasileira. Os deficientes não ocupam os espaços pois a sua primeira dificuldade é sair de casa e depois chegar no destino desejado. E quando assim conseguem, se deparam com locais e pessoas incapacitadas para lidarem com sua condição física, mental ou sensorial. De nada adianta o amparo jurídico se nós, enquanto sociedade, não resolvermos mudar as nossas estruturas materiais e imateriais que são intrinsicamente capacitista como racista, sexista e machista. A multa é apenas um estímulo para que a lei seja obedecida, e não deve ser encarada como apenas um dinheiro perdido. Devemos respeitar as pessoas com deficiência pelo que elas são: pessoas. A deficiência é uma dentre as mais diversas características que possuímos enquanto humanos. A adaptação dos espaços é feita a todo momento por nós, não-deficientes, para nós. Qual a dificuldade em se preocupar na adaptação para os outros tipos de pessoas?
Visibilidade jurídica é uma das primeiras medidas, se não a primeira, a serem tomadas pela briga dos direitos civis. Entretanto, de nada adianta a teoria não conversar com a prática. O que está registrado na legislação nacional não serve de nada se os cidadãos não entenderem a importância do exercício de determinada lei.