Conheça Annandra Lís: Estudante de jornalismo, escritora e amante das culturas populares

A sua raiz interiorana, o amor pelas mulheres e o seu diagnóstico de fibromialgia são alguns dos temas de sua obra, lançada em junho deste ano

Por: Inara Almeida

Foi na cidade das águas mais claras da Chapada Diamantina, Utinga, que Annandra Lís, 23, mergulhou na arte desde que nasceu. Criada num lar cultural, com uma mãe a quem ela descreveu como multiartista, aproximou-se da escrita e teve o seu primeiro poema publicado ainda aos oito anos. Annandra já participou de grupos de dança afro, de teatro e saía na frente segurando o standart que abria a marcha da consciência negra, fazendo jus ao clamor popular que afirma que “Utinga tem arte! Utinga tem artistas!”.

Em 2015, a utinguense ingressou na UFBA, primeiro para a faculdade de arquitetura e urbanismo, mas a impossibilidade de afastar-se da escrita a levou para a faculdade de comunicação. Apenas um ano após chegar na capital baiana foi surpreendida com um diagnóstico de fibromialgia que a afastou, por diversas vezes, desse sonho. “Na sexta-feira da semana do calouro eu já comecei a sentir dores. Foram muitos meses afastada, fAnnandralissiquei um ano sem estudar. Já aconteceu de eu chegar na porta da Facom, não conseguir subir as escadas e ter que voltar para casa.”, conta.

Apesar das dificuldades, Annandra já está no final do curso e nunca deixou de escrever. O isolamento social provocado pela pandemia da covid-19 possibilitou que a autora se aproximasse das oportunidades de publicação dos seus escritos, devido a suas limitações físicas, e, assim, ela publicou um livro solo, Bairrismos e outros amores, e mais duas obras coletivas. 

Mulher negra, lésbica, portadora de deficiência, vinda do interior e amante das culturas populares, estes são alguns dos marcadores que permeiam e impulsionam a escrita da autora. “Eu acredito que levantar essas bandeiras é muito importante, porque demarca um território, de onde eu vim, quem eu sou e isso influencia demais na minha escrita.”, afirma.

Publicações

O amor de Annandra por Utinga, além de tatuado em seu pescoço, foi eternizado na sua obra “Bairrismos e outros amores”. Publicado através da editora Voz de Mulher, o livro é, antes de tudo, uma ode à sua terra, onde ela compara a dor de estar longe com as dores físicas que sente. A escritora também afirma que o seu amor pelas mulheres foi um fator importante para compor a narrativa das poesias, assim como a quebra de estereótipos sobre a sua cidade natal. 

Bairrismo e WhatsApp Image 2021-04-30 at 18.45.29outros amores tem o prefácio escrito por uma utinguense, assim como a quarta capa, que foi escrita por uma professora de letras da escola estadual de Utinga, ambas mulheres lésbicas e interioranas, capazes de entender os recortes que atravessam Annandra. A autora conta que o livro foi escrito de forma fácil, para que os seus conterrâneos possam entender e se sentirem tocados. “Eu quero que esse livro toque as pessoas. Quero que as pessoas entendam a beleza que também existe no interior, assim como em Salvador. Esse percurso de sobreviver à distância, à dor e conseguir lavar esses cortes profundos com as águas cristalinas de Utinga e as águas salgadas de Salvador”, afirma a escritora, que reforça a necessidade de democratização da arte.

O evento de lançamento do livro foi virtual, devido a pandemia, e ainda está disponível no Youtube. Annandra diz que pretende, junto a editora, fazer um evento presencial quanto tudo estiver melhor, com outras autoras e aberto ao público. 

Com mais tempo diante do computador, a artista pôde se apegar a mais oportunidades. A utinguense participou de uma coletânea de contos femininos, Esplêndida, representando Utinga e Salvador com um conto de nome “Ceça”, sobre uma mulher de 43 anos que redescobre o amor. Lançado em março, no mês das mulheres e produzido por mulheres, a autora conta que o projeto foi muito especial e significativo.

A escritora também participou da premiação, “Por Essas Linhas de Cá”, viabilizada pela lei Aldir Blanc. Conquistando o sexto lugar, a crônica A Passarela fala sobre a realidade das passarelas de Salvador e o perigo que elas representam, sobretudo, para os trabalhadores negros que, muitas vezes, são mal vistos e tornam-se alvos de perseguição por conta do racismo. Todos os 70 textos selecionados foram transformados em um livro de mesmo nome da premiação e serão distribuídos para as bibliotecas públicas de cidades baianas.

 Annandra não pretende, jamais, se afastar da escrita. Após concluir a graduação, a estudante de jornalismo pretende engatar no mestrado e doutorado para pesquisar sobre cultura e identidade, que ela garante serem tópicos que fazem dela quem é. A escritora acredita que precisa devolver à sua terra os conhecimentos que adquiriu e quer levar o nome e a história de Utinga para a universidade.

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