Teixeira Coelho, pela primeira vez no Enecult, debate sobre o futuro das políticas culturais
Por João Bertonie
“A verdade é que a cultura dá as respostas, quem faz as perguntas é a arte”. Foi assim que Teixeira Coelho, curador-coordenador do Museu de Artes de São Paulo (Masp) e professor titular da Universidade de São Paulo (USP), iniciou seu minicurso. Ministrado no Pavilhão de Aulas Glauber Rocha, no campus Ondina, da Ufba, na última quarta-feira, 27, o evento fez parte da décima edição do Enecult (Encontro de Estudos Multidisciplinares em Cultura). Para ele, distinguir a cultura da arte é essencial no momento de pensar políticas culturais.
Autor e organizador de livros sobre cultura, como “A cultura e seu contrário” e “A cultura pela cidade”, Teixeira Coelho dedicou as quatro horas do minicurso a falar sobre vários assuntos: da arte como objeto de distinção social à interferência da tecnologia na produção cultural contemporânea. A “indispensabilidade de secretarias e ministérios” dedicados à cultura também fez parte da pauta da conversa.
O valor da arte
Um dos pontos altos do minicurso foi quando o professor, que também é crítico de arte, conversou sobre os valores que atribuímos à arte hoje em dia. Para ele, as pessoas enxergam as mais diversas obras artísticas como objetos de “alto consumo”, no que considera um exercício questionável de distinção social. Apesar disso, ele afirmou que a arte deve ter sempre o seu valor contestado, citando a cena final do filme “Os caçadores da arca perdida” (“Raiders of the Lost Ark”, 1981), na qual a lendária Arca da Aliança é confundida com tantas outras iguais a ela.
Era da tecnologia
O professor também conversou sobre a interferência da tecnologia no modo de ver, pensar e produzir cultura na atualidade. “Marx acertou quando disse, ainda no século XIX, que a tecnologia é capaz de mudar a cultura”, afirmou Teixeira, falando sobre o conceito de “saída cultural” (ir aos lugares de produção e apreciação de arte), colocado em cheque pela entrada da internet na vida das pessoas.
Ao pôr na mesa a discussão sobre os lados positivos e negativos da web, Teixeira afirmou que precisamos nos adaptar a esta nova realidade informatizada. “Por que as políticas culturais continuam voltadas para o mundo pré-internet?”, questiona o curador. Para ele, a rede operou uma “mudança radical” no modo de produzir cultura, mas nós ainda não aprendemos totalmente a lidar com uma “cultura online”.
Teixeira concluiu seu argumento acerca da era da tecnologia falando sobre a mudança que a cultura informatizada promove na vida das pessoas. Citando o filósofo e comunicólogo canadense Marshall McLuhan, ele afirmou que “uma das mensagens do meio é o comportamento”. Contudo, o professor uspiano acredita que é possível uma convivência dos mais diversos equipamentos culturais com a internet: “Não quer dizer que as bibliotecas, os museus serão ‘extintos’, mas as rédeas de consumo e controle recaem agora sobre as pessoas.”
Cultura e arte
Teixeira Coelho ainda conversou sobre a real necessidade da existência de instâncias governamentais para a promoção e regulação da cultura. Para ele, “situações apontam para uma indispensabilidade de secretarias e ministérios da cultura”. O professor afirmou que a política cultural nasce com o Estado, sendo pensada apenas para manter o patrimônio nacional imaterial. Sendo a cultura, algo a se perpetuar naturalmente, no comportamento e hábitos das pessoas, qualquer promoção desta seria artificial e pouco eficiente.
Teixeira aponta para a necessidade de enxergar a arte como objeto de apreciação e promoção. “A cultura serve para proteger, abrigar, unir. A arte existe para violar todos os códigos, para fazer pensar e refletir”, afirma. A arte é sempre o novo, aquilo que “puxa o tapete dos nosso pés”, fazendo necessário, portanto, que nos atentemos para sua valorização: “Nenhum povo pode sobreviver sem uma porta para a inovação.”