Projeto de pesquisa aproxima Brasil e demais países da América Latina

As atividades promovidas pelo Latitudes Latinas incluem ciclos de encontros, programas de rádio, oficinas e um festival, todos na intenção de desconstruir estereótipos

Por: Glenda Dantas

Apesar de estarmos na era da informação, em que, teoricamente, o acesso ao conhecimento é extremamente facilitado, é simples perceber que grande parcela da população brasileira continua enraizada a velhos estereótipos. Principalmente no que diz respeito aos nossos países vizinhos. Na tentativa de amenizar esta situação, o professor Carlos Bonfim (UFBA) idealizou o projeto Latitudes Latinas, que tem como principal objetivo disseminar a cultura latino-americana no Brasil.

Há 10 anos, o Latitudes Latinas integra as atividades de extensão do Instituto de Humanidades, Artes e Ciências (IHAC) e atua na difusão da arte, da cultura e do pensamento crítico latino-americano. Nesse contexto, uma das críticas traçadas por Carlos, desde a concepção do projeto, é voltada para relação do Brasil com os outros países da América Latina. Para ele, a diferença do idioma do Brasil com os outros países da América Latina causa um distanciamento da inserção regional e ocasiona “cegueira, surdez, e insensibilidade, que alguns autores chamam de colonialidade”. Ele considera importante descolonizar esses sentidos e reconhecer outros pólos de emissão de conhecimento.

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Alana Barbosa, Ariadne Ramos e Cris Costa, membros da equipe do Latitudes

Carlos detecta esse fenômeno de distanciamento não somente nos aspectos culturais, mas também nas universidades, principalmente quando se trata da epistemologia adotada pelo Brasil, totalmente baseada em autores do norte global, principalmente europeus e norte-americanos. “Perde-se a oportunidade de discutir autores fantásticos orientais, africanos, latino americanos. No Brasil é como se essas regiões não produzissem nada”, critica. Pensando nisso, a equipe convida autores latino-americanos a realizarem oficinas para professores de escolas públicas, para que a desconstrução dos estereótipos se dêem, inclusive, nos níveis fundamental e médio.

Atuação – As atividades promovidas pelo grupo incluem a realização de ciclos de encontros, programas de rádio e um festival internacional. Semanalmente, o programa de rádio dedicado, exclusivamente, à música produzida na América Latina, em especial nos países da América Hispânica, é feito pela equipe do projeto. “A música entra nesse contexto como um chamariz para que o público se interesse em leituras, artes e cultura”, explica Bonfim.

Além de todo o conteúdo apresentado nos programas, a equipe do projeto disponibiliza no site do Latitudes Latinas outros materiais em podcast. “O ouvinte pode entrar em contato com uma série de outras informações oferecidas nos programas de rádio”, explica Bomfim. Dentre elas, mais detalhes sobre as letras das músicas, instrumentos e artistas. O site do projeto é também alimentado por uma galeria virtual e um banco de textos que propõem diferentes reflexões e trabalham na formação de novas gerações conscientes da cultura que estão disponíveis no continente. Os programas vão ao ar pelas rádios Educadora (em Salvador), Educativa (em Maceió), Universidad de Chiapas – México e Rádio Nacional EBC.

Fazer com que o conhecimento adquirido pelo grupo rompa os muros da universidade e invada as casas, é o objetivo da equipe no seu projeto mais recente, o Latitudes nas Escolas. Por meio da iniciativa, o grupo compartilha com estudantes de escolas públicas da capital produções artísticas e culturais latino americanas. Além disso, divulga através do site e da página no facebook, trabalhos  de jovens moradores das periferias e, a longo prazo, pretendem ampliar para periferias de todo o continente. “Nós atuamos como mediadores e multiplicadores de reflexões e incentivamos os estudantes a, assim como nós, levarem essas discussões aos espaços onde vivem”, explica Alana Barbosa, pesquisadora do grupo.

Outra produção do grupo é o  Festival Latitudes Latinas que dispõe de poesia, bate papos, dança, música e performances, com a finalidade de “colocar no mapa mental das pessoas a ideia de que Brasil é América Latina”, explica Bonfim. Além de evidenciar a relação entre as artes e as culturas dos países dessa região. A III Edição do Festival ocorre de  30 de novembro e  a 02 de dezembro, em comemoração aos 10 anos do grupo. Junto com a celebração de um ano do Rede ao Redor, projeto irmão do Latitudes Latinas. A programação promete uma mostra do que é produzido em diferentes bairros de Salvador.

Vínculos – Em 2013 a UFBA, a partir do Latitudes Latinas, estabeleceu um convênio com a instituição argentina Universidade Nacional de Três de Fevereiro (UNTREF). Junto a ela o grupo realizou encontros e seminários no Uruguai, Chile e, em 2017, na Colômbia.Todos no  intuito de divulgar pensadores e produções acadêmicas e artísticas da América Latina. A equipe possui vínculos também com Coletivos espalhados por toda a região.

No entanto, o trabalho desenvolvido pelo Latitudes Latinas enfrenta algumas dificuldades. Um dos grandes complicadores citados pela equipe é a sustentabilidade financeira do projeto, principalmente no que se refere à formação da equipe, que, além de Carlos, conta com mais três membros, sendo uma bolsista e dois voluntários, Carlos afirma que “têm muitos âmbitos do projeto que caberiam alunos de outros cursos além do BI, mas não podemos garantir bolsa”.

Para realização do III Festival Latitudes Latinas e comemoração dos 10 anos, o grupo conta com o apoio da Pró-reitoria de Extensão (PROEXT) da UFBA, porém não é suficiente para suprir todas as despesas. Como alternativa, o grupo está realizando uma campanha de recebimento de doações para cobrir despesas com transporte, alimentação, hospedagem dos artistas e produção.

Além dos quatro integrantes no Brasil, o grupo conta com mais dois integrantes no exterior e uma rede de colaboradores por toda a América Latina, que contribuem com envio de materiais, sugestões, poemas, áudios e músicas. Através do Latitude nas Escolas o grupo percebeu a magnitude que o projeto está tomando. “Perceber que alguns alunos de escolas públicas já conheciam o projeto foi muito surpreendente, pois notamos que a nossa mensagem está sendo propagada”, conta Cris Costa, que atua como produtor no grupo. O programa de rádio chegou a ser transmitido por oito emissoras diferentes em diversos estados brasileiros e no México e os podcasts disponíveis no site, são ouvidos em todo o país. “As pessoas, além de ouvir, davam esse retorno, demonstravam surpresa quando rompíamos uma série de estereótipos”, declara Bonfim.

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