Dezembro Vermelho: conheça projeto da UFBA que realiza ações de prevenção e conscientização acerca do HIV/Aids
Esclarecer os mitos em torno do tema ajuda a diminuir os preconceitos e tabus
Por Lua Gama
Desde outubro de 2017, foi instituído no país o Dezembro Vermelho: mês de campanha nacional de prevenção ao HIV/Aids e outras infecções sexualmente transmissíveis. Anualmente, são realizadas durante o mês uma série de palestras e eventos, além de outras ações relativas ao tema. A campanha não se restringe apenas ao governo ou órgãos de saúde, mas também, em universidades, a exemplo da UFBA.
Dentro da universidade, o projeto de extensão do Bacharelado Interdisciplinar em Saúde HIV/AIDS: Educar para desmistificar desenvolve uma série de atividades com a comunidade universitária. Além disso, os encontros ocorrem em escolas públicas, faculdades e no sistema prisional.
Coordenado pela doutora em Saúde Coletiva e professora do IHAC Maria Thereza Coelho, o projeto foi criado em 2009 a partir do desejo de alunos do BI em Saúde da época, em desenvolver alguma atividade com o tema dentro da universidade. A equipe do projeto é composta por bolsistas de ensino, pesquisa e a maioria desses alunos são da área de saúde.
Ao longo do ano, são realizados encontros para debater sobre temas acerca das formas de contágio, tratamento; informar quais serviços de saúde realizam atendimento para pessoas portadoras do HIV/Aids e quais são as políticas públicas existentes de combate ao vírus.
“O projeto busca veicular informações corretas e dialogar sobre a percepção a respeito do portador do vírus HIV e da Aids. E também, desmistificar uma série de estereótipos e informações incorretas que existem em torno da síndrome”, explica Maria Thereza.
Além dessas informações, o grupo discute com o público como o vírus e a Aids se manifestam em segmentos populacionais diversos: idosos, indígenas, transsexuais, crianças, profissionais do sexo, dentre outros. As abordagens acerca do HIV/Aids veiculadas na mídia, no campo das artes e quais são os discursos sociais construídos sobre o tema, também são esclarecidos.
HIV e o público jovem
Segundo dados do Ministério da Saúde (MS), no Brasil, cerca de 52,6% dos registros de contaminação com o vírus HIV entre 2007 a junho deste ano, são pessoas de 20 a 34 anos. Faixa etária que corresponde a maioria dos estudantes das instituições de ensino superior, inclusive da UFBA. Para a coordenadora do projeto, esse percentual é um dos motivos que ela acha importante oferecer esse serviço a comunidade estudantil. “O HIV ainda cresce no mundo todo, principalmente, na faixa etária de jovens que é o público de estudantes das universidades. A gente percebe que tem um crescimento muito grande nessa faixa etária e uma necessidade maior de dialogar com esse público”, pondera.
Maria Thereza conta que percebe durante os encontros na UFBA que alguns estudantes ainda acreditam em mitos sobre a síndrome, apesar de estarem em um ambiente de conhecimento. Outro aspecto abordado por ela é que muitos jovens não têm a oportunidade de dialogar a respeito do tema fora dos encontros realizados pelo projeto.
“Discutimos com eles esses pontos que ainda são compreendidos de forma equivocada. […] A gente oportuniza que esses alunos possam refletir e discutir sobre esse tema ligado à sexualidade humana”.
Certos temas são mais difíceis de dialogar com esses alunos por esbarrar em preconceitos e tabus, por exemplo, temas ligados a questões religiosas ou à respeito da sexualidade – orientação sexual e identidade de gênero. “Essa é justamente outra relevância de discutir essas questões, damos a oportunidade das pessoas que chegam na universidade com dificuldade em abordar o tema e com alguns tabus a reverem esses preconceitos”, salienta.
Educar para desmitificar
A educação e a veiculação de informações corretas sobre o HIV/Aids são aliados importantes para combater o aumento no número de casos de pessoas infectadas com o vírus. Apesar da qualidade de vida dessas pessoas terem melhorado ao longo das décadas por conta dos coquetéis antirretrovirais, o HIV e a Aids são considerados uma pandemia mundial. Só no Brasil são registrados anualmente uma média de 40 mil novos casos de Aids, estágio mais avançado do vírus.
“Ainda hoje a Aids é um grande problema de saúde pública no mundo todo. Por isso, é preciso abordar o assunto com toda a população”, defende.
Além da prevenção, educar a população sobre o tema é uma forma de desconstruir os preconceitos e estereótipos equivocados que são lançados em torno dos portadores da síndrome. “A percepção acerca da questão se modifica, se amplia. Você passa a enxergar a questão sob ângulos diversos e isso transforma a sua percepção, abrindo portas para novas possibilidade de atitudes diante delas”, diz a professora.
Sem preconceito!
O preconceito que as pessoas soropositivas e portadoras da Aids sofrem é histórico e carregado de informações incorretas. Quando os primeiros casos de HIV foram registrados nos Estados Unidos na década de 80, acreditava-se que a doença estava atrelada apenas a pessoas homossexuais por elas terem sido as primeiras vítimas a buscarem atendimento nos hospitais.
Com o completo desconhecimento a respeito da doença e com a rapidez que o vírus se espalhou pelo mundo, certos grupos de pessoas foram discriminados e isolados da sociedade na época (principalmente os homossexuais). Quem recebia o diagnóstico de HIV era tratado com desprezo até pelos profissionais da saúde.
“Essa informação inicial equivocada foi a que fortaleceu essa ideia preconceituosa em relação a pessoas que portam o HIV. Por conta disto, é importante desmistificar e acabar com os preconceitos com essas pessoas”, defende.
Sabe-se hoje que o HIV atinge a todos os grupos sociais, sendo considerada uma síndrome “democrática”, pois pode atingir todos os segmentos da sociedade sem distinção. Apesar da realização das campanhas de conscientização, o preconceito e a desinformação diante do tema insistem em persistir, como conta a professora. “Ainda que a qualidade de vida dessas pessoas terem melhorado em muito e os remédios ajudarem a diminuir e zerar a carga viral, o estigma e o preconceito ainda existem”, diz.
Ela ressalta que as pessoas portadoras do HIV/Aids são pessoas normais que podem levar uma vida como qualquer outro indivíduo sem o vírus: podem trabalhar, se relacionar e ter filhos se fizerem o uso correto dos medicamentos.
“É importante não ter preconceito para inclusive, desenvolver uma forma de se relacionar com essas pessoas que seja mais humana e que considere o direito também que essas pessoas têm a uma vida comum”, pondera.
É importante destacar que o contato físico entre uma pessoa que tem o vírus como um abraço, carícia ou aperto de mão, não transmite o vírus HIV. O compartilhamento de objetos como copos, pratos e talheres, também não expõe ninguém à infecção. As verdadeiras formas de contrair o vírus são através de relação sexual de qualquer tipo sem a utilização de preservativo, transfusão de sangue contaminado, compartilhamento de materiais infectados que perfuram ou cortam a pele e durante o parto e a amamentação caso a mãe tenha o vírus e não seja acompanhada por uma equipe médica.
Entenda o vírus
HIV é a sigla para vírus da imunodeficiência humana, que ataca o sistema imunológico e ao contrário de outros vírus, o corpo humano não consegue se livrar deste. Uma vez que o indivíduo contrai o HIV, ele viverá com o vírus para sempre. A Aids, síndrome da imunodeficiência adquirida, é o estágio mais avançado do vírus e ocorre quando a pessoa infectada está com o sistema imunológico muito danificado pelo HIV. Um portador do vírus não necessariamente vai desenvolver a Aids, com a evolução dos medicamentos usados para tratar o vírus, as chances de desenvolver a doença são menores do que em anos atrás.
Com uma vasta experiência na área da saúde, a professora Maria Thereza Coelho explicou essas e outras questões durante a entrevista. Ouça o abaixo:
Direitos da pessoa portadora do HIV/Aids
O Brasil foi uma das primeiras nações consideradas em desenvolvimento, a oferecer os coquetéis antirretrovirais de forma gratuita para o tratamento de pessoas portadoras do vírus. É considerado hoje, uma referência para o tratamento do vírus e da Aids no mundo. O Sistema Único de Saúde (SUS) oferece gratuitamente, desde os exames para a detecção do vírus, até todos os processos de atendimento, tratamento e acompanhamento do quadro clínico do paciente. O Ministério da Saúde disponibiliza no site uma relação com os serviços públicos de saúde que oferecem esse tratamento de forma gratuita, além de outros serviços relacionados às infecções sexualmente transmissíveis.
Confira aqui, quais são os locais que a Bahia dispõe.
Além do devido tratamento médico, outros direitos são assegurados para os portadores do HIV/Aids. É garantido o sigilo absoluto sobre a condição sorológica do paciente, ou seja, ninguém pode divulgar que a pessoa seja portadora do vírus e Aids sem autorização prévia. Se o paciente for contribuinte do PIS/PASEP e FGTS, tem direito ao saque integral do benefício, estendido também para quem possui um dependente que tenha a doença.
Todo portador do HIV/Aids que não tiver condições de se manter financeiramente ou de tê-lo provido por sua família tem direito a receber o Benefício de Prestação Continuada (BPC) pago pelo Governo Federal, independente se for contribuinte da Previdência Social. Quem for portador da Aids é isento do pagamento do imposto de renda quando receber proventos de aposentadoria, reforma ou pensão.
A pessoa que vive com o HIV/Aids que seja segurado e não possa trabalhar por conta da doença por mais de 15 dias consecutivos, também tem direito a receber o auxílio-doença sem a precisar cumprir o prazo mínimo de contribuição. O auxílio deixa de ser pago quando o segurado recupera a saúde e retorna ao trabalho ou quando o benefício se transforma em aposentadoria por invalidez, outro direito garantido por lei.
Além de todos esses direitos, foi sancionada em junho de 2014, a lei 12.984 que prevê pena de um a quatro anos e multa para quem agir com conduta discriminatória contra portadores do HIV e Aids em razão da sua condição clínica. Quem sofrer algum tipo de violação pela sua condição de saúde, deve procurar uma delegacia e realizar um Boletim de Ocorrência.