Rubem Braga: um escritor combativo

*Por Vanice da Mata

A Academia de Letras da Bahia – ALB foi palco do lançamento do livro Rubem Braga -, um escritor combativo na última quinta-feira, dia 4 de julho. Este é o segundo livro de Carlos Ribeiro sobre aquele que é reconhecido, por muitos, como o maior cronista do Brasil.

Resultado da tese de doutorado do também professor da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB e ocupante da cadeira nº 5 na ALB, o trabalho de Carlos levou 4 anos para tomar a forma de livro. Nele o leitor vai encontrar trechos de crônicas, algumas inclusive inéditas. “Como diz o título, é uma face da obra do Rubem um pouco esquecida. Os estudiosos notam que há um elemento da crítica social, principalmente nos dois primeiros livros dele que foram O Conde e o Passarinho (1936) e O Morro do Isolamento (1944). Há a atuação dele como jornalista que acompanhou duas ditaduras: a primeira, no Estado Novo e, a segunda, no Regime Militar, a partir de 1964. Entre estas duas, o arbítrio sempre existiu no Brasil e Braga denunciava a tortura da polícia não mais sobre militantes políticos, mas sobre o povo – o homem comum”, explica o professor.

Antônia Torreão Herrera, doutora em Teoria Literária e Literatura Comparada e professora da Faculdade de Letras da Universidade Federal da Bahia, foi convidada de honra para este lançamento da Booklink Editora na Bahia. Ela orientou Carlos nos bancos da universidade, tanto no mestrado quanto no doutorado. “Carlos fez um primeiro trabalho sobre o lirismo, traço mais forte de Rubem Braga. Agora ele mostra uma face pouco estudada, que é a combativa – tudo isso dentro da crônica. Ele denunciava abusos que pudessem representar qualquer tipo de malogro sobre a própria vida”, revela a professora.

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O também imortal Ruy Espinheira Filho, responsável pela indicação do nome de Braga como objeto de estudo para Carlos, destacou a beleza inerente ao trabalho do “Velho Urso”. “Rubem Braga é sem dúvida um dos maiores escritores da Língua Portuguesa de qualquer época. A crônica é um gênero nosso, especialmente português e brasileiro, e aí ficam ‘torcendo o nariz’ porque saiu primeiro em jornal”, desabafa o escritor. Antonia Torreão reconhece na crônica a característica da rapidez, admitida pelo próprio Braga, inclusive. “Eu nunca escrevi nada que não fosse para ser lido de imediato”, dizia ele, citado literalmente pela professora. “Talvez por isso tenha se criado a ideia da crônica como algo ligeiro, como sinônimo de descartável ou superficial, mas não é”, afirma.

No autor de Cachoeiro de Itapemirim a professora Antônia destaca como um dos seus principais valores a sua capacidade poética. “A escrita de Rubem Braga tem uma precisão de linguagem e uma beleza de construção de imagem, de riqueza de som… ele faz poesia dentro da crônica”. E em pouco mais de 200 páginas Carlos apresenta este “lirismo-combativo”, organizado em 4 capítulos, revelando a face mais afiada do autor capixaba.

“Eu gosto muito de Rubem Braga. Ele é meu escritor favorito e confesso que não conhecia muito este lado combativo. Não tinha atentado para este olhar que Carlos Ribeiro trouxe agora. Estou muito curiosa”, afirma a jornalista e estudante do 7º semestre de Letras da UFBA, Vanessa Yve. Segundo ela, o lirismo é a marca mais forte do Urso. Ela estuda Carlos Ribeiro há 3 anos como membro do grupo de pesquisa O Escritor e Seus Múltiplos, em Letras. “Eu percebo uma semelhança entre Carlos Ribeiro e Rubem Braga porque os dois têm uma sensibilidade incrível na hora de escrever. Em Carlos Ribeiro, em todos os textos, existe a preocupação de flagrar o cotidiano, o que há de mais belo no acontecimento”, revela a estudante.

Foto: Divulgação

 

Carlos parece ter sido vítima do canto da sereia, ainda mesmo nos tempos de sua meninice. “Quando nasci em 1958 na Sagrada Família, um hospital que fica no Bonfim, morávamos na Baixa dos Sapateiros. Desde muito pequeno a minha família já veraneava em Itapuã, e minhas primeiras lembranças são daí e de Itapuã”, revela.  “Fui um menino criado solto nas ruas, nas dunas. Naquela época eu lia mais revista em quadrinhos, e não tive esta tradição de leitura na minha infância. Esta descoberta só veio um pouco tarde, quando estava entrando na universidade, pro curso de jornalismo. Ali eu me encantei com dois autores: o Edgard Allan Poe, e o Anton Tchekhov. Pouco depois surgiria um concurso de contos no Jornal da Bahia, organizado por Adinoel Mota Maia. Fiz o primeiro conto, e publiquei. Depois veio o meu primeiro livro sobre o bairro de Itapuã, com história de pescadores, usando a história do próprio bairro – isso quando eu tinha uns 20 anos. Mas, bem antes disso, eu já escrevia diários e hoje, relendo-os, já percebo, ali, a presença do escritor. Mas esta consciência só me chegou muito depois”, reconhece o homem-menino misto de peixe e pescador.

Recado ao senhor 903 foi a crônica de Rubem Braga escolhida pelo ator Láudio Dourado para marcar o encerramento da solenidade,  iniciando, assim, a sessão de autógrafos. Neste momento Carlos ficou em dúvida se convidaria o ator para declamar ou para interpretar a crônica. De pronto recebeu a resposta de Ruy Espinheira Filho, pela sua direita: “a maior parte de Rubem Braga é poesia, pô!”. Pois então, assim foi.

 

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