Saberes Tradicionais foi tema no 3° Fórum Negro de Arte e Cultura na UFBA
Convidados falaram um pouco de como os conhecimentos dos antepassados estão desaparecendo
Por Lua Gama
Para falar sobre as práticas dos povos africanos e como elas são importantes para a formação do indivíduo, os líderes quilombolas Joselita dos Santos (Dona Jô) e Antônio Bispo (Nêgo Bispo) estiveram à frente da mesa Saberes Tradicionais. O evento fez parte da programação do 3° Fórum Negro de Arte e Cultura e aconteceu na tarde da última quinta-feira (21), no PAF V da UFBA.
Dona Jô, como prefere ser chamada, foi criada em um quilombo em meios às tradições e práticas dos povos afros que foram passadas de geração em geração. Ela criticou o fato destes ensinamentos serem esquecidos por conta do racismo da sociedade, que não legítima e não aceita essas práticas como algo concreto.
“Hoje não existe mais esses ensinamentos. As crianças ficam doentes e precisam levar pro médico, ninguém mais quer usar as plantas medicinais ou tomar banho de folhas. Estamos perdendo o que nos foi ensinado”, disse.
Ela, que é estudante de Ciências Sociais, contou que já passou por situações na universidade nas quais esses saberes tradicionais não foram aceitos. Jô também lembrou de quando se recusou a fazer um trabalho sobre um autor branco. Quando apresentou a proposta de abordar o candomblé, o orientador a proibiu.“O nosso saber está aonde? Na faculdade não querem que a gente fala dele, tem professor que faz tudo pra você tirar da faculdade. Estar na faculdade para o nosso povo é resistência!”, atestou.
Também criticando a universidade, Antônio disse que as instituições de ensino – no geral – ainda são espaços de “adestramento e escravização do indivíduo” devido à mercantilização e hierarquização dos saberes.“O meu povo ensina porque ensinar é diferente de educar. Ensinar é partilhar uma sabedoria, já educar é algo individual. O nosso saber é compartilhado e não é segregado”, explicou.
Para Antônio, as práticas dos povos afros podem ser chamadas de “saber orgânico”, ou seja, um saber resolutivo que envolve diversas práticas e costumes, diferente dos saberes dos povos colonialistas, que não são criados e nem compartilhados com o outro. “Quem pensou a capoeira? Foram nós! O samba, o batuque… Tudo o que nós pensamos cabe todo mundo de forma integrada. Nas práticas dos povos colonialistas não. É tudo segmentado, diferente, é tudo sintético”, disse Antônio.
Antônio também aproveitou para criticar o pós-colonialismo, algo que para ele não existe. “Como existe pós-colonialismo, se a maioria das empresas que estão aqui são da Europa? Se os governantes têm mais de uma nacionalidade? Quando é que esse povo parou de colonializar? O colonialismo é permanente!”, ponderou.