Vale das Manas: estudante da UFBA promove festa acessível para soteropolitanos
Aberta para todos os tipos públicos, festa prega a diversidade e agita cenário do entretenimento em Salvador
Por Lua Gama
Entre uma leitura e outra, provas e trabalhos acadêmicos, o estudante do 4° semestre do curso de Produção em Comunicação e Cultura da UFBA, Douglas Rangelly ainda encontra tempo para ser produtor de uma das festas que vem roubando a cena do entretenimento em Salvador, a Vale das Manas. A festa foi criada com a proposta de abraçar a diversidade do público jovem soteropolitano, com o objetivo de ser um evento não direcionado somente ao público LGBT, mas também ser uma festa que prega a liberdade sexual e de gênero de quem vai para se divertir. A única regra da festa é que haja respeito. E a Pluralidade é marca registrada do evento.
O projeto originalmente começou como uma festa restrita apenas a um grupo de amigos do Whatsapp, em novembro de 2016, no pub Quiora Music, no Rio Vermelho, que atraiu cerca de 200 pessoas, mais do que era esperado. A partir daí, algumas pessoas queriam saber quando haveria uma outra edição da Vale, fazendo com que Douglas e seu sócio Xella assumissem ativamente a produção de mais edições da festa. Eles trabalharam juntos logo na primeira festa.
“Houve uma exigência do pessoal que questionava quando seria a próxima, tanto que não estávamos preparados para lançar a segunda edição, demoramos mais uns três meses. Para uma festa é muito tempo”, conta Douglas.
Douglas alega que o sucesso da Vale se dá ao fato da temática livre e sem rótulos que o evento oferece. “A festa celebra a diversidade sexual e de gênero, e acho que LGBT limita muito a diversidade que existe. Não é uma festa com estereótipo, é uma festa para todo mundo”, esclarece. Por conta disso, a festa conta com um repertório musical eclético que vai do pop internacional ao MPB, do funk ao indie.
“É verdade que pessoas LGBT gostam de ouvir pop, mas não é só isso. Nós, baianos, gostamos de pagode, de funk. Não adianta estereotipar e dizer que é ‘só isso’. Tocamos as músicas que fazem sucesso e agradam o público. Também consideramos importante que haja o reconhecimento da produção baiana”, argumenta.
Segunda edição
No carnaval de 2017, aconteceu a segunda edição da festa que, dessa vez, foi aberta ao público, como acontece até hoje. O evento foi feito no Delicia’s Lounge, lugar onde se estabeleceu o Vale das Manas até a sexta produção.
Conforme o evento foi se tornando mais conhecido, o público foi crescendo, fazendo com que a festa mudasse novamente de local. Da sétima até a décima segunda edição, a Vale das Manas aconteceu no Clube Banhoff, no antigo Ideário. Até o momento, 12 edições foram realizadas ao longo de quase dois anos, tornando a Vale das Manas um evento popular no cenário de festas alternativas da cidade, atraindo em média 400 pessoas.
Douglas conta que, no início, não obtinha nenhum lucro produzindo as festas, mas que apesar disso, ele e o sócio decidiram continuar. “Nas cinco primeiras festas a gente produzia e não lucrava nada, fazíamos a Vale para se pagar. Na sexta edição, pensamos que seria a última, e foi a partir da sétima edição que tivemos um retorno muito positivo. Percebemos que já tínhamos o nosso público fidelizado”, explica.
Atrativos da festa
Um ponto que merece destaque é o fato de permanecer com o mesmo valor acessível da primeira edição paga: o preço do ingresso costuma ser R$10. Segundo Douglas, o motivo é que o open é mais simples do que em festas tradicionais e, principalmente, por conta do local.
“Nós sempre buscamos ocupar os lugares alternativos que estivessem dentro dessa temática da diversidade. Procuramos lugares alternativos para manter o preço baixo. Temos esse acordo de que não importa onde estamos, iremos manter a festa acessível”, explica.
Segundo o estudante, as casas de show em Salvador ditas “padrão” estão adaptando as festas produzidas para se aproximar do cenário alternativo, algo que a Vale propõe desde o início das edições, e por este motivo, atrai um público grande.
“Tentam se aproximar do público que não possui uma renda tão alta com iniciativas de colocar o preço mais barato, por exemplo. Da mesma forma, acaba segregando pois essas pessoas não têm acesso a tudo que é oferecido na festa”, diz. Ele conta que o repertório musical dessas casas também estão mudando, introduzindo o funk e pagode na playlist, por exemplo.
Douglas conta que a festa se estabeleceu de uma forma que até o final do ano, as próximas edições serão mais produzidas e que já estão planejando as edições de 2019. Em Outubro, será realizado o Halloween da Vale, uma festa a fantasia que contará com um open bar acessível de quatro horas, e será diferente da temática americanizada que a data propõe. “Tentamos fugir do halloween tradicional e estereotipado. Buscamos fazer o hibridismo entre o alternativo e a baianidade, coisa que nós sempre tentamos fazer’, comenta.
Aproximação com o público
Desde a confecção dos flyers até os vídeos de divulgação das festa, a produção da Vale é feita integralmente pelo produtor, sócio e uma equipe de 15 promoters. Todo o material fotográfico divulgado nas redes sociais é feito com modelos que vão até a equipe espontaneamente para participar. Segundo o produtor, isso faz com que haja uma aproximação entre a festa e o público. “Nós nos aproximamos do público mostrando ele. Os nossos flyers são com o público, os nossos DJs são o público. Representar o público faz com que ele se sinta acolhido. Nós queremos mostrar a cara do jovem de Salvador”, diz.
Além disso, o produtor e o seu sócio buscam colocar em prática os feedbacks recebidos. Para eles, ouvir o público é um diferencial. “O nosso único pré requisito para tocar certo tipo de música é se o público vai gostar. Claro que ganhamos dinheiro com isso e pensamos no lucro, mas sempre pensamos no desejo do público, pois é ele que faz a festa”, diz. Ele completa que, conforme as edições foram avançando, os feedbacks foram os mais positivos possíveis.
Os frequentadores da Vale têm algo em comum: além de buscarem uma festa diferente das oferecidas por outras casas de Show, o preço da entrada é algo a ser levando em conta na hora de escolher pela balada do final de semana. Ruan Santana, estudante de Enfermagem de uma faculdade em Salvador, diz que além da influência dos amigos que frequentam a festa, o valor acessível contribuiu para que ele fosse a uma edição da Vale. “Organização excelente, playlist ótima, não tem confusão. Independente das diferenças, todo mundo se respeita. Não mudaria nada nessa festa”, diz.
Mais do que um preço acessível e boa música, o jovem considera importante haver respeito dentro do espaço. “independente das diferenças, o respeito predomina”, afirma Ruan. O estudante de Comunicação da UFBA, Gustavo Oliveira, também considera importante a festa ter um público variado. “A questão de ser uma festa acessível, uma festa que tem uma juventude diferente do perfil do público que geralmente frequenta as festas do Rio Vermelho, é uma coisa interessante. Tem a questão do preço também, dez reais é um preço super acessível”, conta.
Teoria x Prática
O estudante pondera que produzir a Vale da Manas o ajuda na graduação, já que alguns projetos que ele realiza no curso, vem das experiências com a festa. “A faculdade é bastante academicista, a gente não tem tanta prática. A vale das Manas me deu a prática antes mesmo de entrar no curso. Me deu um conhecimento que eu não teria aqui dentro (faculdade)”, pondera.