Filarmônica fora da universidade
Por João Bertonie
Fazia silêncio em um dos bairros mais barulhentos de Salvador. No Rio Vermelho, a antiga Igreja da Senhora Sant’Anna, que só ganha vida em festividades pontuais, estava cheia, com uma pequena e silenciosa multidão. À sua frente, os músicos, todos de branco, se preparavam. “Respirem!”, instruiu o maestro, com a voz baixa e suave. Começava “Fantasias Baianas: Contos de um Sertão Filarmônico”, concerto da Filarmônica da Universidade Federal da Bahia, na última terça-feira, 21.
Formada por estudantes da Escola de Música (Emus), professores da instituição e artistas convidados, a Filarmônica interpretou músicas de importantes compositores brasileiros, como “Contos de Fadas”, do baiano Estevam Moura, e “Maxixe Escolar”, do músico Alfredo Moura, que fazia-se presente na ocasião. Após a apresentação de fantasias, valsas e maxixes, a Filarmônica finalizou seu concerto com uma interpretação de “Rapunzel”, a famosa música de Carlinhos Brown.
A plateia, formada em sua maioria por adultos e pessoas idosas, esteve entusiasmada durante a apresentação. Muitos curiosos ficavam à porta do antigo templo, receando entrar, enquanto outros cuidadosamente se instalavam ao lado das improvisadas cadeiras de plástico. Duas crianças, desacostumadas a tal música, reclamavam à mãe que queriam ir para casa. Três senhoras, sentadas logo atrás dos meninos desgostosos, e vestidas de forma elegante, exibiam reações opostas, com semblantes animados.
“É muito bom poder ouvir esse tipo de música, de música clássica (sic), né?”, disse Ivanildes Conceição, 67, ao fim do concerto. Ela era uma das três senhoras, que chegaram à Igreja da Senhora Sant’Anna por causa de um parentesco confuso de uma delas com o maestro José Maurício Brandão, que regia a Filarmônica na noite e que é maestro convidado também da Osufba, a Orquestra Sinfônica da universidade.
Ao fim de “Rapunzel”, quando os músicos já guardavam seus instrumentos e a plateia se dispersava, um dos intérpretes recebia cumprimentos de várias pessoas, falando com todas, enquanto gesticulava agitadamente. Era o professor Celso Benedito, mestre da Filarmônica. “É a primeira vez em que nós viemos a este espaço”, falou, referindo-se sobre a importância da música produzida dentro da universidade dialogar com a sociedade. O professor citou projetos desenvolvidos pela própria Filarmônica em bairros, como a Federação. “O artista tem que estar aonde o povo está!”, afirmou.