Educação midiática para jornalistas: as diversas faces do mundo digital
Imprensa brasileira sofre 11 mil ataques diários pelas redes sociais digitais
Por: Ruan Amorim
As agitações do dia a dia são intensas demais para aqueles que respiram e vivem da informação. Apurar, permanecer antenado a tudo que ocorre no mundo e cumprir prazos curtos são algumas das demandas presentes na rotina dos jornalistas. O objetivo é significativo: contar as histórias que pairam sobre o corpo social e deixar as pessoas cientes do que acontece no mundo.
Pensando na correria cotidiana desses profissionais, o Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio (ITS Rio), o Redes Cordiais e o Kwai fizeram, no último mês, o “Workshop de boas práticas para jornalistas no ambiente digital”. O intuito da formação foi apresentar para os comunicadores ferramentas que potencializem a segurança digital e contribuam no combate a desinformação e discursos de ódio.
A relevância da temática pode ser analisada através da dados da Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Televisão (Abert). Segundo a instituição, a imprensa brasileira sofre 11 mil ataques diários pelas redes sociais digitais, o que resulta em sete agressões por minuto a um veículo ou jornalista.
Atenção: mundo virtual, uma área minada
Na era tecnológica, os repórteres e demais profissionais da comunicação devem estar presentes nas mídias sociais, pois estes espaços tornaram-se fontes de pautas, de contatos, de divulgação do trabalho e de engajamento com o público. Mas, do outro lado da moeda, também são espaços de exposição e dificultam o equilíbrio entre trabalho e vida pessoal. Assim, estes profissionais passam a ser vitimados por questões como invasão da privacidade, vazamento de dados e demais ataques midiáticos. Além disso, abrem as portas para as fakes news.
Em 2020, a Akamai Technologies, uma empresa especializada em segurança, detectou mais de 3 bilhões de tentativas de roubos de credenciais no Brasil. Um recorde diário também aconteceu. No mês de dezembro, em um único dia, houve mais de 55 milhões de tentativas de fraudes.
Por isso, ao fazer uso desse campo minado, cuidados devem ser tomados, pois um passo em falso pode gerar explosões de ataques cibernéticos. O Engenheiro de Software, pesquisador do ITS Rio, Diego Cerqueira, explica que estamos cada vez mais no digital e as nossas vidas entre perfis profissionais e pessoais estão mais próximas. Por isso, é importante falar em segurança digital, que é um conjunto de boas práticas que a gente faz quando colocamos no papel o nosso checklist (lista de verificações).
“É muito importante para poder manter não só os nossos aparelhos eletrônicos seguros, mas as nossas identidades, os nossos rastros digitais. Estar conectado à internet significa deixar rastros digitais, e com a segurança digital estamos tentando nos defender de ataques, acessos não autorizados e vazamento de dados”, diz Cerqueira.
Para a prevenção de furtos de informações pessoais, o engenheiro recomenda que os usuários ativem a autenticação de múltiplos passos, que gera uma camada adicional de segurança para as contas. Ele também diz que é importante ter senhas diferentes para cada rede social digital e indica duas ferramentas que podem ajudar a criar e gerenciar as chaves: Lastpass e Bitwarden.
“É um problema quando se tem uma única senha para plataformas diferentes. Se um dia uma delas for vazada, você corre o risco de ter muitos serviços invadidos. Dessa forma, uma ótima prática é não utilizar senhas repetidas. Sendo assim, você pode usar gerenciadores para não precisar decorar 20 chaves ou mais. Eles vão criar senhas complexas para você e armazená-las em um ambiente criptografado”, explica o pesquisador.
Discurso de ódio
São muitos os métodos que ajudam a prevenir roubos de credenciais no mundo digital, mas o que se pode fazer contra os discursos de ódio que são disseminados nessa esfera, principalmente para os profissionais da comunicação? No país, os ataques a jornalistas nas redes digitais cresceram 222% entre 2019 e 2020, de acordo com o relatório Voces del Sur.
Neste ano, entre março e junho, um levantamento feito pelo ITS juntamente com a Repórteres sem Fronteiras (RSF), identificou 500 mil tweets com hashtags de ataques à imprensa brasileira. Em meio a esse cenário, o vice-presidente da Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo (Abraji), Guilherme Amado, explica como agir.
“No primeiro momento, temos que fazer um descolamento, observar se o ataque é para o jornalista ou é direcionado à imprensa. Embora essa instituição seja formada por mais autores do que os jornalistas, nós somos quem colocamos a cara ali, então é natural que uma indignação contra a entidade imprensa seja direcionada a quem está com face mais expostas. Por isso, não se deve dar atenção a todo ataque que recebe”, pontua.
Amado aconselha o bloqueio dos haters e trolls para evitar que emissores de ataques ganhem engajamento. Além disso, sinaliza que “essas transgressões não são liberdades de expressão, pois não existe liberdade para ofender o outro, pelo contrário, é crime. Então, o jornalista pode gravar, denunciar na própria plataforma e buscar auxílio jurídico quando entender ou suspeitar que aquilo cruzou a linha do aceitável. E, caso se sinta ameaçado, deve fazer uma denúncia a polícia”.
Desinformação: todo cuidado é pouco
As Fake News são outro ponto importante a ser analisado no universo cibernético. Elas podem enganar até mesmo os profissionais que trabalham com a informação. Nessa perspectiva, a jornalista especialista em combate à desinformação, que atua na Lupa, a primeira agência de fact checking brasileira, Clara Becker, apresenta maneiras para reportar os fatos com responsabilidade e se blindar contra as notícias falsas.
“Tem habilidades de rotina de verificação de informação que devem ser incorporadas no dia a dia do repórter. Temos que tomar muito cuidado para não amplificar a desinformação, porque a imprensa tem esse poder, afirma Becker.
Para ela, o jornalismo profissional é um dos alvos dos agentes da desinformação, que querem emplacar seus conteúdos enganosos em meios de comunicação jornalísticos em prol de uma maior disseminação. “Os repórteres não têm o hábito de checar o colega de outra redação. Então, é bem comum a gente ver uma mesma notícia em vários canais de informação. Isso porque o comunicador parte do princípio que o primeiro jornalista que deu a matéria fez a verificação, mas se ele não fez, diversos sites podem estar dando uma informação falsa”, diz a especialista,
Por isso, o ideal é que os profissionais de comunicação busquem aprender sobre os padrões de desinformação para ter mais facilidade de reconhecê-los. Além de buscar verificar todas as informações que recebem sempre.
“Cada um é responsável por aquilo que compartilha. No caso do jornalista, por aquilo que publica. Então, temos que ter muito cuidado com a informação que veiculamos. Sendo assim, é sempre bom lembrar de um velho ditado: se sua mãe diz que te ama, confirme”, enfatiza Becker.