Violência contra indígenas é tema de debate na UFBA
Evento “Racismo e Anti-racismo no Brasil” reuniu lideranças indígenas, negras e quilombolas no último dia 31 na UFBA
Por Gabriel Moura
Entre 2014 e 2016 ocorreram 393 assassinatos de indígenas no Brasil, de acordo com dados do Conselho Indigenista Missionário (Cimi). A principal causa das mortes foram os conflitos de terra envolvendo os índios e os produtores agrícolas. Essa questão, além do preconceito contra os povos nativos brasileiros, negros e quilombolas, foi discutida no evento “Racismo e anti-racismo no Brasil”, que aconteceu no último dia 31, na UFBA.
“Nós tentamos convencer a população de que nós não somos o mau da sociedade. Muito pelo contrário. Boa parte dos conhecimentos que existem no Brasil são frutos da cultura indígena. Nós somos o complemento da sociedade”, afirmou o Cacique Babau, um dos líderes indígenas presentes no debate. Também participaram do evento a ex-candidata à vice-presidência do Brasil pelo Psol Sônia Guajajara, Edson Kayapó (professor do IFBA), Eunice Kerexu (cacica da aldeia Morro dos Cavalos, SC), Eliete Paraguassu (marisqueira quilombola da Ilha de Maré) e Samuel Vida (Professor da Faculdade de Direito/UFBA).
Segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai), atualmente existem 565 terras de demarcação indígena, o que corresponde a quase 15% do território brasileiro. A maior parte das reservas se concentram na região amazônica. Na Bahia existem atualmente 30 terras demarcadas.
O Cacique Babau é o principal líder dos Tupinambás de Olivença, tribo situada na região sul do estado baiano, entre os municípios de Ilhéus, Buerarema e Una. Em 2009, ano em que o território foi declarado como reserva indígena, se iniciou uma violenta disputa entre proprietários de terra e os índios, que resultou em mortes e trocas de tiros.
“Nós estamos lá há centenas de anos. Nós que recebemos os portugueses em Ilhéus e resistimos até agora, mesmo depois de tantas guerras e genocídio. Ninguém vai remover os Tupinambás de seu lugar”, defende o Cacique, que chegou a ser preso em 2010 por causa do conflito, sob acusações de invasões de fazendas, vandalismo, incêndio, tentativa de homicídio, resistência a prisão, entre outros.
Conseguir o apoio da população não indígena é um dos grandes desafios dos índios. “Infelizmente as pessoas só percebem se revoltam com essa causa quando o filho delas é envenenado pelos agrotóxicos que são usados justamente pelas pessoas que querem nos tirar de nossas terras para fomentar o agronegócio e o latifúndio”, afirmou Sônia Guajajara.
Novo governo
A eleição de Jair Bolsonaro para a Presidência da República também foi tema de debate no evento. Sônia Guajajara afirmou que o presidente eleito é “louco, possivelmente esquizofrênico, que resolveu assumir uma figura de fascismo”. Bolsonaro já se posicionou contra as reservas e afirmou em entrevistas que “no que depender de mim, não tem mais demarcação de terra indígena”.
“Pela primeira vez na história, as pessoas que votaram e elegeram um candidato à presidência estão torcendo para que ele não cumpra as suas promessas de campanha. Mas nós sabemos o que irá acontecer e já está acontecendo. Ele faz parte de um projeto da volta da extrema-direita que não está apenas no Brasil, mas na América Latina e no mundo”, alertou Sônia sobre o novo presidente.
O tema do fascismo também foi abordado no debate. O professor do IFBA Edson Kayapó lembrou de fatos como as chamadas “Guerras Justas”, promovidas pelos portugueses, que diziam que os índios que não aceitassem a fé cristã deveriam ser mortos e os que fossem cristianizados deveriam ser escravizados. Ele classificou a perseguição histórica sofrida pelos povos nativos do Brasil como um “fascismo histórico”.
“O fascismo que todos mencionam hoje, nós indígenas sofremos desde 1500. Houve um genocídios dos povos indígenas e pouco é falado sobre o tema. É um ‘fascismo histórico’ contra nós que até hoje perdura”, afirma o professor.