Xote das meninas: Mulheres que estão transformando o ritmo do forró

Por: Madu Motta

 

Desde dos primórdios do ritmo nomeado forró, escutamos nas letras a presença fiel da mulher. Em sua maior parte sendo detalhada por sua áurea de mistério e seu perfume de botão de laranjeira, como canta Geraldo Azevedo, ou o cheiro da Carolina trazido por Luiz Gonzaga. A mulher-menina, também é simbolizada como alguém a ser conquistada, que vai às festas e é cortejada, está sempre sendo vista por essa ótica sedutora.

Outro aspecto tradicional da cultura forrozeira, são os trios nordestinos, normalmente formados por um sanfoneiro, um zabumbeiro e também um tocador de triângulo.  Mas, o que muitas pessoas ainda não conseguem imaginar, apesar de ser uma realidade cada dia mais presente, é a existência de grupos de forró comandados por mulheres. Em entrevista a Agenda de Arte e Cultura, a banda Flor de Imbuia, criada em 2018, e composta totalmente por mulheres, traz esse aspecto para o contexto soteropolitano com músicas populares tradicionais, mas também inovando no repertório e no uso de diferentes instrumentos.

Como surgiu a ideia de formar um grupo de forró composto exclusivamente por mulheres?

A Flor de Imbuia se tornou uma banda formada por mulheres um pouco pelo destino e também por nosso desejo. Inicialmente éramos uma banda mista formada por seis pessoas e depois de um ano de banda um integrante saiu, pois ele ia mudar de cidade e então tínhamos mais um homem. Nós já tínhamos esse desejo latente em comum entre nós, mulheres, de nos tornarmos uma banda totalmente feminina e então aproveitamos esse momento de reformulação, conversamos com o outro integrante sobre o nosso desejo e assim nos transformamos em um grupo de forró feminino.

E qual foi a maior motivação para vocês se unirem e criarem um grupo de forró feminino?

 

Nossa motivação vem da percepção da necessidade de uma representatividade maior das mulheres no cenário musical como um todo, principalmente instrumentistas. Nós somos quatro mulheres instrumentistas e sabe-se que na cultura musical as mulheres instrumentistas são pouco valorizadas. Isso é uma característica que acaba chamando muita atenção do público e a gente percebe esses olhares de pessoas que estão conhecendo nosso trabalho e vendo quatro mulheres tocando instrumentos. Já que os grandes nomes de mulheres na música são normalmente associados a vocalistas e não necessariamente a instrumentistas.

Como vocês enxergam a evolução do forró ao longo dos anos e a contribuição de vocês para essa transformação?

 

O forró é uma forma de expressão que partiu de um movimento regional nordestino, e hoje é conhecido e praticado mundialmente. O forró, sempre foi plural desde a sua origem nos bailes de forró se toca xote, arrasta- pé, baião, xaxado. Estas são células rítmicas que se somam ao samba e ao maracatu, e que dão vazão a outros ritmos como o sertanejo universitário, nos anos 90 e o piseiro mais recentemente. Além dos trios tradicionais formados com triângulos, zabumba e sanfona, surgiram bandas maiores que acrescentam outros instrumentos como guitarra, baixo, bateria, então o forró traz essa liberdade de experimentação musical.  Hoje existem bailes e festivais de forró em quase todos os continentes. Grupos compostos por mulheres tem o forró como expressão da sua subjetividade, e da sua força, e questionam letras machistas, homofóbicas. A Flor de Imbuia chega com a proposta de simbolizar o poder da mulher em ocupar um lugar de produção e vivência do forró nesse ambiente que ainda segue dominado por homens.

Como vocês veem a representatividade feminina no cenário do forró atualmente?

   

A representatividade feminina no forró sempre existiu, desde o começo. A gente tem Marinês, Anastácia, que compôs diversas músicas com Dominguinhos. Mas a representatividade feminina mesmo existindo ela não é valorizada. Então esse movimento não era fomentado antes e continua não sendo devidamente valorizado. Claro que atualmente existe uma mudança maior, as mulheres forrozeiras tem se unido ainda mais, mas continua sendo muito gritante o quanto as grades de apresentações de festivais famosos são majoritariamente formadas por homens, e não é porque não existem forrozeiras boas, e sim porque não nos dão espaço. Então nós como banda precisamos botar a nossa cara mesmo com as várias dificuldades para criarmos mais representatividade e influência para as próximas gerações.

De que forma a união de mulheres no grupo fortalece a dinâmica e a convivência entre vocês?

 

O fato de sermos uma banda formada somente por mulheres reflete muito na nossa autoconfiança. Na hora de desenvolver o trabalho, a gente se sente muito à vontade para colocar as ideias e devaneios na roda e isso se desenvolve muito facilmente. Acredito que o principal é a liberdade que a gente tem em lançar ideias sem medo. E de alguma forma a gente sempre impulsiona umas às outras, quando às vezes uma não tá acreditando muito a gente incentiva. E naturalmente nossa relação fora da banda se desenvolveu junto com esse apoio, com esse amparo.

Qual foi o momento mais marcante da carreira do grupo até agora e quais as expectativas para o futuro?

 

Nós tivemos três momentos marcantes da carreira do grupo: O primeiro foi em 2021, quando gravamos o nosso primeiro álbum no meio da pandemia. Então não podíamos fazer shows, mas passamos em um edital e conseguimos gravar o nosso primeiro álbum com oito músicas autorais e foi muito positivo pro grupo. Depois disso muita coisa mudou. Tivemos o nosso primeiro show no São João de Vitória da Conquista. Esse foi nosso primeiro São João em palco grande. E o terceiro foi a nossa viagem para São Paulo, onde fizemos alguns shows com outras bandas, inclusive formadas por mulheres também, que tocavam forró de rabeca. Foi muito positivo para o grupo ver um pouquinho mais da nossa potencialidade, além de termos a possibilidade de ver que também agradamos públicos de outros estados. E nossos planos incluem um novo álbum, com novas canções autorais e novas viagens também para mostrar o nosso trabalho em outros estados e talvez até fora do país.

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