Diogo Lula: a arte de vender tortinhas
Por Luiza Leão
Um vendedor barbudo, garrafa térmica vermelha na cabeça, vasilha na mão e um discurso convincente na ponta da língua: “São as melhores tortinhas do universo”. Se você já viu essa figura pelo Campus de Ondina, certamente experimentou as tortinhas vendidas por Diogo Lula. Graduando em Bacharelado Interdisciplinar em Artes, o estudante de 29 anos aproveita o tempo que passa na UFBA para ganhar o seu sustento.
Soteropolitano nascido e criado, Diogo Lula é um exemplo de quem busca encontrar, verdadeiramente o seu lugar no mundo. Além de vendedor nato, é uma excêntrica mistura de interesses. Atualmente cursa o segundo semestre do Bacharelado Interdisciplinar em Artes. Diferente do que aconteceu nos quando cursou publicidade e pedagogia, pretende concluir o BI.
Casado, conheceu sua esposa quando era convertido à religião Testemunha de Jeová. Praticante e ativo na fé, pregava cerca de oito horas mensais quando se converteu. Elisabete, até então sua amiga, pregava 40 horas mensais. Eram quase Eduardo e Mônica, versão gospel. Cada vez mais convicto do seu credo, decidiu que iria se batizar. Infelizmente, não pôde. O fiel não tinha tempo de pregação suficiente comparado à média mensal nacional que era de 10,5 horas mensais. Mas o abandono da religião teve o estopim por outro motivo: sua barba. “Esse pedido de tirar a barba eu não entendia. Perguntava aos líderes um motivo, mas só me diziam que não podia”, confessou. Juntou outras dúvidas e desilusões e disse adeus.
Em 2014, Diogo foi aprovado no vestibular. Pensando numa forma de ganhar dinheiro conciliando com os estudos, resolveu levar mais a sério a venda das empadinhas doces que já acontecia em seu antigo trabalho. A iniciativa surgiu como uma inovação para a tradição de levar caixas de bis para os veteranos, quando estava recém contratado na empresa. O agrado para os amigos virou uma forma de ganhar um dinheiro extra e hoje, se tornou fonte de renda. “Trouxe as tortinhas para a UFBA para ver se dava certo. E deu”, afirma, e não há quem negue.
O início
As empadinhas passaram a se chamar tortinhas a partir da fala de uma cliente, ainda no primeiro dia de vendas pela universidade. “O apelo ficou maior quando comecei a chamar de tortinhas, mas ainda assim não era tão convidativo”, explica Diogo. Foi então que seu discurso começou a ser mais apelativo. Dizia que elas eram muito boas, as melhores do universo. No terceiro dia, já cantarolava o jingle “ As melhooores tortinhas do universooo”. Segundo ele, a brincadeira atraia a clientela e quebrava o gelo com o cliente, tornando o trabalho mais agradável.
A receita não é tradicional de família, mas já se tornou entre os estudantes. A partir da adaptação de uma receita da internet a primeira fornada – de muitas- saiu. No início, quando vendidas no antigo trabalho, apenas dois sabores integravam o cardápio: tradicional, semelhante às empadas salgadas e com massa de chocolate.
Diogo gosta de inovar criando outros sabores de tortinhas. Sua mais recente criação, a choconanacocoveia (chocolate, banana, coco e aveia) é vegana e a mais vendida atualmente. A tortinha de maçã está em fase de teste e em breve estará à venda. Os demais sabores são milho com manteiga, amendoim, romeu e julieta e os carros chefes: waffle holandês e chocolate.
O estudante oferece, também, uma raridade que dificilmente é trazida para a UFBA: tortinha de brigadeiro de banana. A ideia surgiu a partir do encontro com duas meninas paranaenses vendendo o brigadeiro “diferentão” na fila do Restaurante Universitário. A apreciação pela receita alheia foi tanta que acordaram em trocá-las, afinal, se tratando de vendas simultâneas de um produto artesanal do outro lado do país, não há concorrência.
Marketing: 1 é 3, 2 por 5
“Promoção atrai promoção” é um dos jargões de Diogo, já que, rotineiramente, cria promoções. Visando fixar corretamente o nome do produto nos clientes, presenteia com uma tortinha pequena a primeira pessoa do dia a falar “as melhores tortinhas do universo”. “Tem gente que fala que são as melhores empadas do bairro, as empadinhas mais gostosas do mundo, as melhores tortinhas do mundo, ou qualquer coisa assim”, conta em tom de brincadeira. Ele acrescenta que já chegaram a ligar pra ele para falar a frase, na esperança de ser o primeiro ou a primeira do dia.
Outra inovação de Diogo Lula é a dança da vasilha vazia. Não é o mais novo viral do YouTube e nem adianta procurar na internet. Só pode ser assistida ao vivo e uma vez por dia, já que agora as tortinhas são vendidas em apenas uma vasilha e não mais em duas como no ano passado.“Eu não permito filmar porque é uma experiência única, é aquele momento. Ultimamente, queremos registrar e deixamos de vivenciar os momentos das nossas vidas” explica. Os passinhos dançantes embalados pelo som da flauta doce é brinde exclusivo de quem consome a última tortinha da vasilha de Diogo Lula, como uma forma de incentivar as vendas finais que normalmente demoram para sair.
Já o casamento do chai com as tortinhas nasceu da necessidade de uma bebida para acompanhar o quitute, em uma feirinha gastronômica que aconteceu no IHAC. Comprou uma garrafa térmica de seis litros, encheu da bebida quente e o resultado foi um só: sucesso. O curioso é que a bebida é vendida e servida na cabeça. Hoje ele nem precisa mais distribuir a prova da bebida em copinhos de 50 ml, como fizera no início para fidelizar a clientela. A bebida já foi até batizada por um estudante de química como o “ catalizador” das tortinhas. Marketing de vendedor, marketing de cliente.
Recentemente, Diogo criou o “open bar de chai” que funciona como uma finalização do ciclo de trabalho, liberado quando as tortinhas acabam antes do chai. Como todo open bar, a consumação da bebida é liberada gratuitamente, para quem ganhar a dança da vasilha vazia e seu grupo de amigos “É uma festa”, relata. Se você estiver solitário e não tiver com seu grupo de amigos para usufruir do open bar, pode participar pagando qualquer valor, para contribuir com os custos dos copinhos descartáveis. Tudo isso, ao som da rádio tortinha: caixinha de som que toca hits que vão desde Djavan, Jorge Ben Jor à Sândalo de Dândi. Ao final do dia, o estudante aproveita a prática de andar com a garrafa na cabeça para também levá-la de volta para casa, praticando o “chai surf”, no ônibus.
Como se não bastassem tantas estratégias de vendas, o estudante deseja obter a satisfação total dos seus clientes “Caso não goste eu devolvo todo o dinheiro, mesmo que ele coma toda a tortinha. Mas nunca precisei devolver”, garante. Segundo ele o grande diferencial de seus produtos são as matérias primas de qualidade, o tempo de forno em que são submetidos e é claro, simpatia, carisma e leveza na hora de vendê-los.
Expansão
Para o Futuro, Diogo Lula tem planos que vão desde a compra de um forno industrial à contratação de funcionários e aluguel. Por isso, pensa em começar aos poucos, vendendo caixinhas com duas, três, dez, doze tortinhas, em caixinhas personalizadas e distribuídas em padarias da cidade.“ Expandir é dar um tiro no escuro”, destacou.
Bateu uma fome? Quer comer uma tortinha? Você pode pedir o número para o vendedor, entrar no grupo das tortinhas no Whatsapp ou dar uma volta entre o Paf 3, a biblioteca e a Facom, fazendo uso do bom e velho, boca a boca, para encontrar o vendedor das “Melhores Tortinhas do Universo”.